segunda-feira, 23 de julho de 2012

Neon: Espelho, II

Neon: Espelho, II: -Ora ora ora, se não é meu bom e velho eu.
Pela cara vejo que mudou, mas não uma mudança esperada eu suponho. - Ele chega de fininho, seus passos são silenciosos, deslisa ao andar, estou na mesma sala escura, sem portas nem janelas, eles me assusta.
-E pra ajudar está no mesmo lugar, sentado no centro e choramingando – enquanto falava, dava voltas em torno de mim, me olhando, analisando, parecia estar com medo, cauteloso – Se mudou, diria que te compararia com uma puta pobre, que conseguiu a atenção do alto escalão – parou na minha frente, abaixou-se para me olhar nos olhos, eu desviava – No fundo no fundo, é a mesma merda de sempre.
-Vejo que mudou também meu caro – eu disse – não está mais me xingando tanto ou querendo me matar, mal se aproxima de mim.
Ele, eu, para por um instante, de costas pra mim solta aquela velha risada demoniaca, extremamente alta – Também estou com saudades, finalmente me respondeu, coisa que não tinha feito vez passada, não preciso te xingar, não ainda, se mudei, sabemos o porquê – virou-se pra mim, olhos negros com ódio e esperança – Eu queria que você mudasse, que aceitasse, que fosse realista- ouvir o tom da minha voz começando a crescer e se alterar me dava arrepios, continuei de cabeça baixa, ele continuou – Olha pra você, você me enoja, porque não levanta e me olha nos olhos, ah sim! Claro! “sou anti social, eu não gosto das pessoas”, foda-se, eu já ouvi isso tantas vezes, a verdade é que você tem medo delas, mesmo eu as odiando ainda mais, apenas as encaro, e quanto a você, solta esse seu sorrisinho escroto e diz um 'Oi' murcho, isso é muito pior, isso é humilhante, você continua sendo um nada,. Não sabe conversar – ele, eu, não calava a boca, meu medo estava se transformando em raiva – Não sabe . .. - aproximou-se rapidamente de mim com passos largos, levei um chute na boca, senti meus dentes moles e o gosto tipico de sangue, cai de costas no chão, apoiou um pé no meu peito, soltando o peso – Não sabe expressar o que está sentindo, olha pra mim seu filha da puta, nos meus olhos, o que? Tem medo de encarar a si mesmo? O que faz quando passa na frente de um espelho, corre dele? - olhei, minha boca sangrava e meu coração batia forte e rápido – Se nem raiva você sabe expressar, vou ter que te bater mais pra você esboçar raiva e soltar um palavrão? como conseguirá expressar amor, como conseguirá mostrar o que está aqui – quando disse aqui, deu-me um soco no peito e saiu, fiquei deitado sentindo o chão frio, olhava apenas os calcanhares dele a minha frente.
-A Merda é que você me vem aqui muito raramente, mas queria que viesse pra bebermos umas cervejas e você me contar que está tudo mudado e ok, mas não! - gritou, voltou, me pegou pelo colarinho, me ergueu e disse baixinho, olhando dentro dos meus olhos – olha pra você, retiro o que eu disse sobre você ter mudado, realmente continuamos um lixo – me soltou e voltou a olhar para a parede.
-Tem medo de ficar louco é ? de ficar sozinho ? Deixa eu te adiantar uma coisa, já está sozinho, e logo logo ficará louco, sociopatinha de merda.
-Não – respondi- não estou sozinho, eu tenho ela, e ambos sabemos que eu a amo.
-Há! - ele deu um pulo, sorriso sarcástico grudado na cara – ela! Ela está certa, você não sabe se expressar, você parece que nem a ama, frio, inutil, não fala o que pensa e sente, é um fiasco – sai do centro e fui em direção dele, devagar – eu sei muito bem o que sente mas que adianta ein ? Você continua o mesmo, não mudou.
Dessa vez ele deve ter sentido o gosto de sangue, minha mão chegou a doer.
-Agora me escuta – comecei a falar – Você não a conhece como eu conheço, eu tenho mudado e sabemos disso, devagar, mas tenho, eu vou mudar e você vai ficar quietinho, vai até me dar a tal cerveja da próxima vez, ela é tudo pra mim, você não deve falar nela, nunca mais, ou então te quebro ao meio – quando percebi estava tremendo, mas estava com uma sensação ótima, ele sorriu, sorriu espantado e admirado, satisfeito.
-Não precisa mais de mim por enquanto, mas é melhor você mudar, e você sabe muito bem disso, é só um toque de amigo- enquanto limpava a boca, ele se afastava para os cantos escuros do quarto, novamente estava sozinho, mas não mais sentado no centro.

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